Secretaria de Saúde reativa comitê de crise para enfrentar superlotação na pediatria
A Secretaria Municipal de Saúde (SMS) reativou o comitê de crise para coordenar ações emergenciais diante da superlotação dos serviços de saúde da Capital, especialmente na área pediátrica. Nos moldes do comitê criado durante a pandemia da Covid-19, o grupo se reunirá, no mÃnimo, duas vezes por semana, à s segundas e quintas-feiras, além de realizar rodadas diárias de monitoramento da situação nos hospitais.
A medida foi adotada após o agravamento do cenário assistencial, com crianças sendo internadas em corredores hospitalares devido à ocupação total de leitos e equipamentos disponÃveis. Segundo dados da SMS, apenas no Hospital de ClÃnicas de Porto Alegre, todos os leitos de UTI pediátrica estão ocupados, mesmo com a abertura de leitos extras.
O comitê reúne representantes de todos os hospitais que atendem pelo Sistema Único de Saúde (SUS) na Capital: Pronto Socorro, Hospital Materno Infantil Presidente Vargas, Hospital São Lucas da PUCRS, Santa Casa de Misericórdia, Instituto de Cardiologia, Hospital de ClÃnicas, Grupo Hospitalar Conceição, Vila Nova, Restinga, além do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) e unidades de pronto atendimento (UPAs).
Relatório - A gravidade do cenário foi evidenciada em relatório interno que aponta a ocorrência de 35 atendimentos em uma única noite na emergência pediátrica, resultando em 11 internações em apenas oito horas. Quatro dessas crianças não conseguiram vaga em outros hospitais da rede.
O secretário municipal da Saúde, Fernando Ritter, ressalta que Porto Alegre e os municÃpios da Região Metropolitana enfrentam um processo de desfinanciamento dos hospitais públicos, agravado pelo Programa Assistir e pelo fechamento de leitos, como no caso do Hospital de Pronto Socorro de Canoas.
"A partir desta semana, temos um comitê de crise em funcionamento, com reuniões diárias envolvendo todos os hospitais, pronto-atendimentos e a Coordenação da Atenção Primária em Saúde. Seguiremos firmes, jamais inertes. Não sossegaremos diante da dor das pessoas e da sobrecarga enfrentada por nossos trabalhadores", afirmou Ritter.
Ampliação de leitos - Segundo o secretário, Porto Alegre tem enfrentado a crise com recursos próprios. Foram abertos novos leitos pediátricos, de UTI e para adultos em resposta à temporada de doenças respiratórias. Ao todo, foram adicionados 227 leitos - novos ou convertidos para atendimento de SÃndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) ou com suporte ventilatório.
A cidade também ampliou o horário de funcionamento de 15 unidades básicas de saúde nos fins de semana. Em articulação com o Instituto de Cardiologia, a SMS viabilizou ainda a abertura de mais dez leitos de UTI pediátrica e oito leitos clÃnicos, com inÃcio de operação previsto para a primeira semana de julho.
"Faremos o possÃvel e até o impossÃvel, mas há limites técnicos, humanos e fÃsicos que não podemos transpor sozinhos", alertou o secretário. Ritter observou que Porto Alegre não dispõe mais de estrutura fÃsica para expansão e que a sobrecarga se aproxima do limite do insustentável.
Unidades básicas - Durante as reuniões do comitê, gestores apontaram a necessidade de mudanças estruturais para evitar novas crises. Uma das principais propostas é a reintrodução de pediatras nas unidades básicas de saúde, medida que já demonstrou eficácia na redução de encaminhamentos para atendimentos especializados.
Dados da SMS mostram que equipes multiprofissionais com presença de pediatras conseguiram reduzir em mais de 90% os encaminhamentos de crianças para filas de especialistas. As unidades analisadas registraram quedas nas solicitações pediátricas entre 37,5% e 96,77%.
Apesar da eficácia da medida, o secretário apontou o financiamento como principal obstáculo. "Não há qualquer incentivo financeiro por parte dos governos federal e estadual para o retorno dos pediatras à s unidades básicas. Isso ocorre porque a retirada desses profissionais foi uma diretriz da reforma sanitária brasileira, que há cerca de 30 anos reorientou a atenção primária com base na Estratégia Saúde da FamÃlia", explicou Ritter. Nesse modelo, o cuidado é prestado por equipes multiprofissionais e médicos de famÃlia e comunidade, com formação voltada ao atendimento integral em todos os ciclos de vida, incluindo a infância.
Modelo flexÃvel - Ritter defende que cidades com alta densidade populacional, grande vulnerabilidade social e sazonalidade de doenças respiratórias infantis, como Porto Alegre e sua região metropolitana, precisam de modelos mais responsivos e flexÃveis. Evidências recentes mostram que a atuação integrada de pediatras na Atenção Primária, em parceria com médicos de famÃlia, aumenta a resolutividade e qualifica o cuidado à infância.
Transparência - O comitê de crise tem como objetivo ampliar a transparência das ações e promover a redução de danos por meio da coordenação integrada entre todos os serviços de saúde. As reuniões diárias de monitoramento permitirão ajustes constantes na distribuição de pacientes e na otimização dos recursos disponÃveis.
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Lissandra Mendonça